(...)
– Então posso constar no questionário do censo que o senhor é ateu? O senhor se
importa?
–
Claro que me importo! Não sou ateu. Sigo a minha religião, que é o futebol,
como já te disse. É na redondinha que eu acredito. Toda minha fé num gol!
–
Bom, o senhor me perdoe novamente. Mas vou ter que constar no levantamento do
censo que o senhor não possui religião.
–
Meu amigo, você já foi a um jogo de futebol?
–
Sim, senhor.
–
Mas a um jogo lotado, estádio cheio, torcida vibrando. Já foi?
–
Sim, já fui.
–
E pelo visto você tem um time, estou certo?
–
Sim, tenho.
–
E costuma acompanhá-lo sempre, até ir nas partidas você vai.
–
Sim, sempre que possível, eu vou.
–
E não se importa de pagar ingresso, certo? Mesmo caro do jeito que está.
–
Não...
–
Então vai me dizer que um negócio que tem templos e milhões de seguidores fiéis
não é religião?
–
É... Talvez o senhor tenha mesmo razão...(*) (**)
É
com esse diálogo que elucidamos algo que está presente não somente aqui no
Brasil, mas em grande parte do mundo: o poder Sagrado que o futebol tem. Apesar
de bastante controverso, ninguém pode tirar do futebol o valor que ele tem. O
valor de dar uma perspectiva de um futuro melhor a milhões de crianças moradoras
de locais indignos a vida, o valor de uma ascensão social, o valor da
possibilidade de saída da miséria, o valor, nem que seja momentâneo, de um
pouco de alegria, ou pelo menos fugir da realidade.
Muita pessoas acompanham seus times de futebol como
verdadeiras procissões religiosas, tratam seus uniformes como "mantos
sagrados", se enchem de fé para ver seu time ganhar um jogo, fazem
promessas aos céus para um título de campeonato, tratam jogadores como
verdadeiros deuses. Existe até o termo "deuses do futebol" aqui no
Brasil. Já na Argentina, por exemplo, foi criada a Igreja Maradoniana, em
homenagem a Armando Diego Maradona, maior futebolista do nosso país irmão. Foi
fundada em 1998 na cidade de Rosário. Resolveram considerar a data de
nascimento de Maradona como Natal. A partir disto criaram uma igreja com orações
e mandamentos, com seguidores cadastrados em vários países. Argentina, Espanha
e México são, respectivamente, os países com o maior número de fiéis. A
religião tem o tetragrama sagrado, D10S, que mistura a palavra em espanhol para
Deus (Dios) com o D de Diego e o 10 da sua camisa. Já no nosso país mãe,
Portugal, o jogador Mário Coluna era alcunhado de "Monstro Sagrado".
E há outros exemplos espalhados pelo mundo, como a passagem do troféu da Copa
do Mundo por lugares quase inóspitos um pouco de felicidade.
Por fim,
podemos citar os amistosos criados para difundir algo bom pelo mundo. Como por
exemplo o amistoso que ficou conhecido como o "Jogo da Paz", em 2004,
entre a seleção brasileira então campeã do mundo e a seleção do Haiti, local do
jogo que sofria com uma guerra civil. E tanto outros jogos de caráter
humanistas que aconteceram pelo mundo.
*Título tirado do livro homônimo de cartuns sobre
futebol do cartunista e escritor argentino Roberto Fontanarrosa.
**http://www.gazetadopovo.com.br/blog/populares/?id=1094065