domingo, 9 de março de 2014

Alteridade, violência e mídia.


A mídia contribui para divulgação e reflexão sobre diversas temáticas, principalmente sobre a violência urbana, uma vez que as notícias que envolvem esse tema são bastante comentadas pelos meios de comunicação e consequentemente pela população. A grande quantidade de notícias envolvendo a violência urbana fazem, mesmo que de forma inconsciente, que as pessoas assumam a violência como algo normal, corriqueiro.

A mídia, mais especificamente os telejornais, deixam de assumir um papel de observadora e narradora dos atos de violência nos grandes centros urbanos e passam a agir também como responsável. Em países com um índice alto de desigualdade social, como o Brasil, a violência apresentada pela mídia parece ter mais impacto na sociedade.

Um caso recente que obteve grande repercussão nos telejornais brasileiros foi sobre o adolescente negro acusado de praticar roubos e furtos, no bairro Flamengo no Rio de Janeiro, onde foi espancado e preso nu pelo pescoço a um poste com uma trava de bicicleta por três homens no Rio de Janeiro, considerado os "justiceiros".

Analisando o discurso cedido pela jornalista Rachel Sheherazade, âncora do jornal SBT Brasil, o que se tem é uma construção de representação do criminoso, o outro, fora das perspectivas da alteridade. Segundo a jornalista:

 “O marginalzinho amarrado ao poste era tão inocente que, ao invés de prestar queixa contra seus agressores, preferiu fugir antes que ele mesmo acabasse preso. É que a ficha do sujeito está mais suja do que pau de galinheiro”.

Com um discurso fácil que se diz em defesa da sociedade de bem, a jornalista se mostra em defesa aos “justiceiros” reforçando atos de violência e criando uma representação do criminoso, como alguém fora dos padrões normais da sociedade, que deve ser isolado com convívio ou até mesmo exterminado, como se não fosse fruto de uma sociedade desigual. A jornalista atribui os atos de violência urbana a ineficiência policial.

“As representações do outro em tempos de crise refletem uma profunda divisão entre um nós correto e um eles desordenado (...) A construção do outro como poluído e poluidor, fora do controle e perverso, é motivada pela necessidade de manter o sentimento de retidão, de ordem e controle”. (Joffe, 1999, p. 124)

No discurso de Rachel Sheherazade, todas as características negativas são jogadas para o rapaz amarrado ao poste, como justificativa a atitude dos possíveis “justiceiros”. “A necessidade de manter o controle parece ser satisfeita através da degradação do outro indesejado.”( Ramos, 2003)

O outro, nesse caso o rapaz amarrado ao poste, é visto como algo que deve ser eliminado, banido de imediato a fim de proporcionar tranquilidade aos demais. Um rapaz negro e pobre, que reforça o discurso que a culpa pela existência de crimes está associada à pobreza, nessa relação de alteridade e violência é possível analisar a crítica convivência entre as classes sociais e a existência de racismo e preconceito.

Atitudes como a da artista plástica Yvonne Bezerra de Melo que se mostrou em “defesa” ao rapaz amarrado e as atitudes dos direitos humanos parecem ser banidas pela maioria da sociedade, que tendem a criticar que os direitos humanos estão apenas para os criminosos, um discurso muito reforçado pela mídia e que não condiz com a realidade. Não se pretende eliminar do criminoso as consequências das suas atitudes, mas de procurar que seja realizada a justiça de forma ética e humana.

O outro, o criminoso, não pode ser compreendido como algo isolado construído pela individualidade, sem que houvesse uma interação social muitas vezes marcada pela exclusão social e desigualdade, que por agir de maneira que vai de desencontro as regras vigentes deve ser eliminado.

A mídia como formadora de opinião deve agir como mediadora, agindo como um meio de reflexão sobre a violência urbana, sem encarar a violência como algo banal e os considerados criminosos como uma anomalia da sociedade.



                            O outro, um jovem negro e pobre amarrado a um poste acusado de roubo.


Maria Amanda.

A Democratização da Comunicação, na Luta Contra o Estereótipo e o Preconceito

Como a democratização da mídia ajudaria no combate ao preconceito e ao processo de estereotipia tão presente na comunicação brasileira, em relação às minorias políticas no Brasil? Basta percebermos e realizarmos uma reflexão: Quando nós vemos os povos indígenas ou quilombolas, por exemplo, representados em um programa de TV aberta - É praticamente nula a produção de conteúdo (embasado e coeso) voltados para certos setores da sociedade - Os indígenas por exemplo, são postos de maneira (erroneamente) humorística, por supostamente "não saberem falar corretamente", ou o negro, marginalizado e relacionado a má educação, nas telenovelas brasileiras.
A televisão já faz parte da cultura brasileira e é a principal fonte de informação e formadora de opinião da sociedade. Porém, existe um grande problema causado pelos grandes monopólios das empresas de comunicação do país, que dominam as TV's, rádios e jornais impressos: A falta da diversidade dos pontos de vistas na comunicação, causada pelo o acúmulo de poder nas mãos de poucos que "dominam" a informação no país.
A autora Eclea Bósi, explica no seu livro: O tempo vivo da memória, como se dá o processo de estereotipia:
"Quando entramos em um ambiente novo, de estimulação complexa, passamos por instantes de atordoamento. Tudo é uma mancha confusa que hostiliza os sentidos. Aos poucos, as coisas se destacam desse borrão e começam a nos entregar o seu significado, à medida da nossa atenção. É o trabalho perceptivo, que colhe as determinações do real, as quais se tornam estáveis para o nosso reconhecimento, durante algum tempo.
Essa colheita perceptiva, relação de trabalho e de escolha entre o sujeito e o seu objeto, pode sofrer um processo de facilitação e de inércia. Isto é, colhem-se aspectos do real já recortados e confeccionados pela cultura. O processo de estereotipia se apodera da nossa vida mental."

E são esses recortes  confeccionados do real, que nos são apresentados e repercutidos pelos meios de comunicação, sobre uma cultura, fatos, ou minorias, a falta de diversidade nas informações que nos são dadas ajudam a reforçar certas definições congeladoras, ou estereótipos por muitas vezes preconceituosas.

A luta pela democratização da comunicação vem para combater o comportamento da mídia atual, afim de fazer valer de fato a liberdade de expressão e a democracia na produção de contudo em comunicação, com variedade, diversidade etno-racial, de gênero e orientação sexual. A pluralidade também faz parte da luta pela democratização, combatendo os monopólios das empresas de comunicação e estimulando a produção local. 



fonte: http://paraexpressaraliberdade.org.br/

¿De tod@s para tod@s?

O ¿DE TOD@S PARA TOD@S? É uma série de documentários realizados pela cooperativa de trabalho audiovisual Booooo e financiados mediante crowdfunding, que tratam de examinar a situação dos serviços públicos essenciais da Espanha.




O projeto é destinado aos cidadãos da Espanha que queiram entender as diferenças por trás dos modelos de gestão pública e privada dos sistemas de saúde e educação. Longe de uma linguagem técnica ou prolixa, busca tornar a informação acessível para aqueles que desejam compreender os detalhes da gestão e administração dos recursos de saúde e educação do país com o objetivo final de todos a tomar sua posição de forma livre e informada.


Tolerar a existência do outro,
E permitir que ele seja diferente,
Ainda é muito pouco.
Quando se tolera,
Apenas se concede
E essa não é uma relação de igualdade,
Mas de superioridade de um sobre o outro.
Deveríamos criar uma relação entre as pessoas,
Da qual estivessem excluídas
A tolerância e a intolerância.”
(José Saramago)



O que é alteridade? É ser capaz de apreender o outro na plenitude da sua dignidade, dos seus direitos e, sobretudo, da sua diferença. Quanto menos alteridade existe nas relações pessoais e sociais, mais conflitos ocorrem.


A nossa tendência é colonizar o outro, ou partir do princípio de que eu sei e ensino para ele. Ele não sabe. Eu sei melhor e sei mais do que ele. Toda a estrutura do ensino no Brasil, criticada pelo professor Paulo Freire, é fundada nessa concepção. O professor ensina e o aluno aprende. É evidente que nós sabemos algumas coisas e, aqueles que não foram à escola, sabem outras tantas, e graças a essa complementação vivemos em sociedade. Como disse um operário num curso de educação popular: "Sei que, como todo mundo, não sei muitas coisas".


Numa sociedade como a brasileira em que o apartheid é tão arraigado, predomina a concepção de que aqueles que fazem serviço braçal não sabem. No entanto, nós que fomos formados como anjos barrocos da Bahia e de Minas, que só têm cabeça e não têm corpo, não sabemos o que fazer das mãos. Passamos anos na escola, saímos com Ph.D., porém não sabemos cozinhar, costurar, trocar uma tomada ou um interruptor, identificar o defeito do automóvel... e nos consideramos eruditos. E o que é pior, não temos equilíbrio emocional para lidar com as relações de alteridade.


Daí por que, agora, substituíram o Q.I. para o Q.E., o Quociente Intelectual para o Quociente Emocional. Por quê? Porque as empresas estão constatando que há, entre seus altos funcionários, uns meninões infantilizados, que não conseguem lidar com o conflito, discutir com o colega de trabalho, receber uma advertência do chefe e, muito menos, fazer uma crítica ao chefe.


Bem, nem precisamos falar de empresa. Basta conferir na relação entre casais. Haja reações infantis...


Quem dera fosse levada à prática a idéia de, pelo menos a cada três meses, um setor da empresa fazer uma avaliação, dentro da metodologia de crítica e autocrítica. E que ninguém ficasse isento dessa avaliação. Como Jesus um dia fez, ao reunir um grupo dos doze e perguntar: "O que o povo pensa de mim?" E depois acrescentou: "E o que vocês pensam de mim?"


Quem, na cultura ocidental, melhor enfatizou a radical dignidade de cada ser humano, inclusive a sacralidade, foi Jesus. O sujeito pode ser paralítico, cego, imbecil, inútil, pecador, mas ele é templo vivo de Deus, é imagem e semelhança de Deus. Isso é uma herança da tradição hebraica. Todo ser humano, dentro da perspectiva judaica ou cristã, é dotado de dignidade pelo simples fato de ser vivo. Não só o ser humano, todo o Universo. Paulo, na Epístola aos Romanos, assinala: "Toda a Criação geme em dores de parto por sua redenção".


Dentro desse quadro, o desafio que se coloca para nós é como transformar essas cinco instituições pilares da sociedade em que vivemos: família, escola, Estado (o espaço do poder público, da administração pública), Igreja (os espaços religiosos) e trabalho. Como torná-los comunidades de resgate da cidadania e de exercício da alteridade democrática? O desafio é transformar essas instituições naquilo que elas deveriam ser sempre: comunidades. E comunidades de alteridade.


Aqui entra a perspectiva da generosidade. Só existe generosidade na medida em que percebo o outro como outro e a diferença do outro em relação a mim. Então sou capaz de entrar em relação com ele pela única via possível – porque, se tirar essa via, caio no colonialismo, vou querer ser como ele ou que ele seja como sou - a via do amor, se quisermos usar uma expressão evangélica; a via do respeito, se quisermos usar uma expressão ética; a via do reconhecimento dos seus direitos, se quisermos usar uma expressão jurídica; a via do resgate do realce da sua dignidade como ser humano, se quisermos usar uma expressão moral. Ou seja, isso supõe a via mais curta da comunicação humana, que é o diálogo e a capacidade de entender o outro a partir da sua experiência de vida e da sua interioridade.


Fonte: http://revolucoes.org.br/v1/conferencia/alteridade

Marinaleda

        Marinaleda é um município da Espanha que fica na província de Sevilha, comunidade autónoma de Andaluzia, de área 25 km² com população de mais ou menos 3000 habitantes. Marinaleda se destaca dos demais municípios por não conhecer o desemprego e viver à sombra de sua cooperativa agrícola, isso fruto de um modelo econômico no qual a participação do povo e a igualdade são prioridades.


Em Marinaleda não há polícia e as decisões políticas são tomadas em uma assembleia em que todos os habitantes participam. Os orçamentos votam-se em plenários públicos e as pessoas juntam-se em assembleia para aprovarem as despesas que se realizam. O salário de todos os trabalhadores, seja qual for o seu cargo, é de 47 euros por dia, seis dias por semana, ou seja, uma média de mil 128 euros por mês por 35 horas semanais.


Um breve documentário sobre Marinaleda:


        

Mergulhando na religiosidade de várias partes do mundo, a escola de samba Mocidade Alegre escolheu como enredo desse ano "Andar com fé eu vou, que a fé não costuma falhar!", assinado pelos compositores Ana Martins, China da Morada, Douglas Sabião, Marcio Bueno, Rodriguinho e Victor Alves, e encantou o público ao tratar sobre os diferentes modos de vivenciar a fé.




A escola vestiu várias de suas alas com elementos de religiões como o judaísmo, o candomblé, o islamismo, o espiritismo e crenças indígenas. Também foi levado à avenida elementos da superstição, como o gato preto, a numerologia e o horóscopo.






A escola, em sua apresentação, mostrou diversas faces da fé dividindo-a em os elementos que representam a fé, e como ela pode mudar a vida das pessoas; os templos como um lugar onde os homens professam sua fé, com destaque para diferentes homens de fé e sacerdotes; a fé como o equilíbrio entre o mundo terreno e o resto do universo, no qual se sustentam as crenças; o mercado da fé: a comercialização de produtos religiosos e o proveito que alguns líderes de igrejas tiram da fé alheia; e, por fim, induziu o público a buscar dentro de si a força interior para conseguir superar as barreiras e obstáculos que a vida apresenta.




quinta-feira, 6 de março de 2014

Namaste




Deus, ou o Espírito Criador; o Grande Arquiteto da Maçonaria, o Aion teleos, ou Mônada dos Gnósticos. A Primeira Causa, a hipótese necessária na qual se ligam todas as teorias. O Homem, ou Espírito Criado, cuja a vida aparentemente começa e termina, mas cujo o pensamento (alma) é imortal. O Mediador, ou Cristo homem, Deus humanizado pelo trabalho e pela dor. “O homem, nada podendo conceber acima de si mesmo, idealiza-se para conceber Deus.” (Alphonse Louis Constant. 1810-1875). Cristo, por seus pensamentos e virtudes, realizou este ideal. É através do Cristo que se deve estudar Deus; ele que é, também, o modelo da humanidade. E quem é Cristo se não o Homem?

“O homem é o filho de Deus, porque Deus, manifestado, é chamado o filho do homem. Foi depois de ter feito Deus em sua inteligência e seu amor que a humanidade compreendeu o verbo sublime que disse: ‘Faça-se a luz!’” (Alphonse Louis Constant. A Ciência dos Espíritos.)

Quando buscamos nos conhecer, acabamos por conhecer o outro. Tomamos noção de quem somos nós quando compreendemos quem é o outro. Segundo Leopoldo e Silva, a busca da identidade (conhecimento de si) é ao mesmo tempo a tentativa de conhecer o outro. Como explica Santo Agostinho em suas Confissões (354-430), um itinerário para Deus é também uma trajetória em que o indivíduo vai ao encontro de si. Quando se volta para si (para a sua interioridade), o ser humano encontra Deus na própria alma: é a conversão. A razão para esta afirmação é que, segundo Santo Agostinho, Deus habita o mais profundo de nossa alma. É olhando para dentro que se pode encontrar a si mesmo e a Deus.

Entre mim e Deus, no entanto, a relação é de alteridade. Por alteridade entendemos que é a concepção que parte do pressuposto básico de que todo o homem social interage e é interdepende do outro. A existência do "eu-individual" só é permitida mediante um contato com o outro. E não há nada mais antagônico e oposto do que a relação entre um ser finito (criatura) e um ser infinito (o criador). Deus é o Outro Absoluto. Então, como explicar, mesmo com toda essa diferença, a convergência da busca de si e de Deus? Talvez a resposta para essa questão encontre-se na criatura. Deus, como criador, é a causa maior da minha existência e não posso descobrir quem sou sem me referir a Ele. Partindo desta lógica (que provenho de Deus), logo minhha identidade finita transcende além de mim em direção a este Outro Absoluto e infinito e se realiza completamente por ser Ele a razão do meu ser. Só me encontro verdadeiramente econtrando a Deus, porque minha identidade está nele.

Descartes reflete sobre esse paradoxo quando diz “penso, logo existo”; o que sou bem como o que posso saber de mim se completam no encontro com o Outro (Deus). A filosofia de Descartes encontrou a ideia de infinito, que possui uma característica própria de ser maior que a própria mente que a pensa e a conceitua e que, portanto, não poderia ter sido produzida pela consciência de um ser finito. Ao constatar a própria existência, não nos deparamos com outras consciências igualmente finitas, mas a Deus, o Outro Absoluto e infinito. Isto porque eu mesmo, ser finito, poderia ter criado correspondências igualmente finitas, uma vez que são compatíveis comigo em grandeza. Eis a razão pela qual não chego a Deus através dos outros, mas posso chegar aos outros através de Deus. Na logica de Descartes, o Outro (que é Deus) vem antes do outro que seria outro eu finito.

Diferente de Santo Agostinho, onde encontramos em nós a presença de Deus, em Descartes encontramos a marca de Deus em nós, a sua ideia, o sinal que Ele deixa em nós para que possamos encontrá-lo. E esse sinal é mais claro que a representação de outros seres com os quais compartilhamos a mesma natureza finita.